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Jura?

Posted: October 28th, 2021 | Author: | Filed under: himen elastika literatura erótica anti-pornográfica | Tags: , , , | Comments Off on Jura?

(DRAMA/conto erótico)

 

“Não sei se eu gosto mais tanto de mim quando estou com você. Gosto mais de quando não estamos juntas e outros assuntos me abordam pelas calçadas da cidade enquanto eu caminho para que eu não precise pensar em você. Como impeditivos produtivos. Me apego a qualquer conversa aleatória que me distraia e faça com que eu me sinta viva de uma forma diferente a que eu me sentia antes contigo. Gostaria de desejar a sua felicidade hoje, mesmo após um tempo de despedida, mas ainda sinto um sentimento contrário à saudade de você. Sinto muito por ter me contatado.”

Juro que essa foi a última mensagem que gastei minutos escrevendo e enviando por e-mail. Por e-mail e para a minha ex. Nem sei o que é mais antigo e inadequado nessa situação. Infelizmente, ao receber uma mensagem que, por mais estranho e simbólico que pareça foi parar na caixa de spam, não resisti à respondê-la. Achei que apagá-la não a apagaria da minha cabeça mesmo e tinha razão. Senti um orgulho e uma grande decepção por mim.

Quando saímos de relacionamentos decadentes ou abusivos podemos nos sentir avessas ao amor por um tempo e com amor não me refiro à paixões românticas construídas por casais modelos monogâmicos. Amor no sentido de gentilezas como um tempo. Se vivenciamos curtos ou longos períodos de negligência amorosa, lidar com a presença do amor se torna difícil.

Depois que Amanda e eu terminamos, não consegui aceitar abraços por três meses porque ele me abraçava sempre após nossas brigas, quer dizer, as brigas que ela criava. Não consegui avisar do término para os meus amigos. Eles que descobriram. Não conseguia mais escrever nada que não fosse angustiante ou mórbido. Minhas dores se tornaram minhas amigas e era somente com elas que eu podia conversar. Quando visitei minha mãe, logo em seguida, suas mãos tocaram o meu cabelo. Eu me assustei e comecei a chorar. Era como se meu corpo tivesse se configurado para identificar qualquer aproximação afetiva como uma ameaça.

Nem preciso falar que foi impossível até me imaginar em outra relação por meses. O medo de me assustar com afeto preenchia a minha cabeça e tornou meus dias um pouco frígidos. Para não afundar no colchão da minha cama, me obriguei a frequentar alguns lugares que se pareciam com quem eu era antes de conhecê-la. Deixando um pouco de lado experiências muito novas ou aparentemente muito festivas. A festividade obrigatória era uma característica dela. Voltei a frequentar bibliotecas, shows, amigas e a casa da minha família. Foi muito importante retornar a esses lugares e ouvir “que bom revê-la” em outras palavras. Os abraços começaram a ser mais desejados por mim e a fazerem mais sentido. Minhas amigas se tornaram realmente minhas amigas de novo e a minha dor ficou na posição de dor. Sem misturar os prazeres e as feridas. Pude sentir, de verdade, que o tecido do meu corpo se regenerou e finalmente me senti pronta para abrir mão um pouco das experiências antigas e partir para os desejos novos.

Perto do meio do ano, uma amiga me ligou e pediu para que eu fizesse um juramento de que não adiaria mais o meu encontro com o amor. Ela tinha perspectivas bonitas sobre espiritualidade, filosofia e vida. Amor não era uma pessoa que eu encontraria em algum momento na vida. Amor era, inclusive, uma justificativa para parar de procurar pela “pessoa a amada” e tentar me tornar uma pessoa amável para mim. Conversamos sobre marcar de marcar de marcar de tentar nos encontrar, até que nos encontramos. Quando a vi, fiquei feliz por ainda ter me reconhecido nela e por ela ter se reconhecido em mim. Nós sempre tivemos o costume de dizer que nos amamos, que somos amantes. Meu amor por ela nunca foi uma dúvida como foi o meu amor por mim em alguns momentos. Em dias piores, meu amor por mim já foi uma dívida e hoje até sobra. Passamos o dia juntas na região da República para carregar nossas raízes com lembranças da nossa juventude. Antes de nos despedirmos, ela me disse que tinha conhecido alguém que se parecia comigo.

– Jura? – perguntei curiosa.

– Juro. Ela é o contrário de mim, assim como você. Tem os pés mais presos no chão do que eu e coragem suficiente para manter as pessoas próximas à ela seguras. Sem contar que é linda e vem me visitar nesse final de semana, lá em casa. Eu acho que você adoraria conhecê-la.

Na manhã do final de semana fez sol como eu pedi e eu me preparei para ir, cumprindo o juramento. Botei uma calcinha vermelha e brincos de anéis de saturno. Fazia tempo que não passava tinta nos olhos e que não menstruava no final do mês. Minha amiga disse que nosso encontro também fez com que menstruássemos juntas. Gosto de acreditar na coincidência da sincronização menstrual. Desci correndo as escadas quando percebi que já estava na hora e que minha amiga que viria me buscar já tocava a campainha.

Ainda ajeitando os brincos, abri a porta e me surpreendi com um sorriso que não conhecia.

– Marcela me mandou buscar você. Tem bastante gente estranha na casa dela e ela não quis deixar eles sozinhos. Você sabe como ela é, né? Conhece melhor que eu.

Continuei em silêncio sem saber quem era.

– A propósito, eu sou a Íris, amiga da Marcela. A gente não se conhece mas ela me falou que você ficaria muito brava se eu me atrasasse então vim correndo o mais rápido que eu pude.

– Íris, claro. Marcela me falou de você. Não tinha reconhecido.

Íris continuou sorrindo de leve para mim enquanto meu coração acelerou batidas o suficiente para eu perceber que alguma coisa nela tinha despertado algo em mim.

– A gente já pode ir? Minha moto tá ali do outro lado da rua. Prometo que não te deixo cair.

E fomos. Íris tinha o pescoço à mostra e uma jaqueta típica das motoqueiras lésbicas. Seus olhos eram grandes e ela não tinha nada no rosto que fosse artificial. Seu cheiro era de alguma colônia que com certeza tinha sido formulada para hipnotizar mulheres como eu. Ela me disse que eu podia apoiar os meus braços nela. Fiquei desconcertada por estar tão perto. Passamos o caminho conversando sobre nossa amiga em comum e as pessoas estranhas que encontraríamos na festa.

– Antes de sair para te buscar, tinha um cara cuidando do som que queria botar umas músicas dele pra gente ouvir enquanto umas meninas tavam dançando algumas músicas nostálgicas dos anos 2000. Tenho certeza de que escapei de ver uma briga rs. – disse Íris.

– E você tava do lado de quem?

– Das meninas, é claro.

Na porta da casa de Marcela, Íris e eu nos olhávamos e ríamos sobre o que poderíamos esperar da festa. Marcela abriu a porta e me deu um abraço e disse baixinho:

– Sabia que ia gostar dela.

Fiquei vermelha por dentro mas disfarcei o suficiente para pelo menos uma delas não notar. Íris me convidou para tomar uma bebida e me levou pela mão. Enquanto caminhávamos pelas pessoas desconhecidas, de tempos em tempos ela virava a cabeça e me olhava com carinho. Na cozinha, nos servimos e encostamos no balcão e ela me perguntou:

– Como eu sei quando você tá atraída por alguém?

– Quando o alguém é parecido com você, fica fácil de perceber.

Ela me deu um abraço antes de me dar um beijo. Minha temperatura corporal, com certeza, subir para 700º e eu poderia facilmente competir com o sol quem estaria mais quente. Nos olhamos fixamente durante uns segundos. Dizem que fazer esse exercício aumenta o amor, se ele já existir. Fiz um carinho entre seus olhos e suas orelhas. Nos beijamos durante as músicas mais e menos pedidas. Nossas mãos alternavam entre nossas nucas, barrigas, braços, bochechas, cabelos e virilhas. Ela interrompeu nosso beijo para dizer que estava sentindo uma vontade absurda de transar. Eu disse que adoraria que ela conhecesse a minha casa e que podíamos sair de fininho. E saímos. Andar de moto com ela intensificou a sensação. Passei o caminho todo sentindo um orgasmo vindo e o meu cabelo ficando bagunçado com o vento. Olhei para ela no retrovisor e seu olhar pra mim me deixou mole. Senti como se estivessem derramando um copo cheio de água na minha calcinha devagar. Entramos em casa desesperadas para transar uma com a outra. Deitamos no sofá e nos beijamos mais uma vez. Tive que levantar para fechar a porta. Ela foi até mim e me apertou contra a parede. Tirou os meus sapatos e a minha calça. Botou a calcinha para o lado, ergueu minha perna e me tocou seus dedos. Tive um orgasmo em uns dois minutos. Respirei fundo e pedi para que fizesse de novo. Agora eu e ela, no sofá, ao mesmo tempo. Tiramos as roupas todas e nos tocamos juntas. Não gozamos ao mesmo tempo mas uma e depois a outra. Repetimos. Ela pediu para que eu dobrasse os joelhos, com a barriga para baixo, “de quatro” para me chupar. Depois sentou na minha boca e sentiu a minha língua. Uma hora nossos corpos precisaram de água. Também  fiz um café. Ela me disse que gostou de como eu organizava as coisas da minha casa, eu disse que ela podia ficar para dormir.


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