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O corpo em que coube uma vagina – Conto erótico

Posted: March 14th, 2021 | Author: | Filed under: himen elastika literatura erótica anti-pornográfica | Tags: , , , , , , , , | Comments Off on O corpo em que coube uma vagina – Conto erótico

“Aguardente

para aguardar você.

Do “ardente” me faltou o “ar”

quando eu reparei

que já seria

um corpo em que coube uma vagina

e que sabia o que viria.”

Esse texto virou notícia na cidade em que viviam Camila e suas amigas.  Cada pedacinho de palavra que compunha as frases esquentava o rosto das leitoras, mas também dos denunciadores seguintes. As pessoas que leram e se incomodaram, relataram seus incômodos com a palavra vagina e com a hipótese do texto ser de caráter lésbico.

Mas como sempre se imagina, muitas mulheres e meninas da cidade se encantaram com o que diziam aquelas palavras coladas nas paredes de diversos lugares da cidade como lambe-lambes.

Camila era uma delas. Encontrou com Cecília ao meio-dia para discutirem uns textos da faculdade, mas em um momento de distração, Cecília soltou o que pensava sobre o texto que viralizou:

– Não sei quem fez porque não tem autoria mas poderia dizer que tem a cara de qualquer uma de nós.

– Com certeza, eu não seria tão criativa. – disse Camila.

– Será que não? Já tentou sentar pra escrever uns lances desses? – disse Cecília.

– Não… Mas acho que prefiro ler as reflexões das outras e achar coisas que me tocam. – disse Camila.

Voltaram aos textos acadêmicos por mais 10 minutos, até que se questionaram:

– O que será que ela quis dizer com isso? – Cecília.

– Isso o quê? – disse Camila.

– “um corpo em que coube uma vagina”… – disse Cecília.

– Entendi que ela quis dizer que ter uma vagina não é simples. Ganhamos e perdemos muitas coisas quando nascemos com uma e por isso não pra  qualquer um. – disse Camila.

– E você gosta de ter uma? – disse Cecília.

– Hoje sim. Mas ainda acho difícil. Só que além de achar difícil, acho legal, sensual, bonito e inspirador. Tá aí a diferença. – disse Camila.

Camila e Cecília se conheceram logo no início da faculdade de arquitetura em grupos que discutiam sobre diversos feminismos. Reivindicavam sempre o quanto ter uma vagina afetava a vida de algumas pessoas e o quanto ter um pênis trazia mais “poder” à outras. Esses debates eram difíceis. Depois de um tempo, eles se tornaram impossíveis e praticamente inexistentes, pelo menos na academia.

Na vida fora da universidade – e no rolê sapatão principalmente – as vaginas eram observadas, discutidas e admiradas o tempo todo. Às vezes como musas, outras como objeto de estudo coletivo ou como um assunto recorrente.

Cecí tinha algumas tatuagens de buceta nos braços e nas costas. Camila preferia que os desenhos de buceta ficassem fora de seu corpo e pintava-os nas paredes das ruas. Cecí e Camila compartilhavam o tempo todo desenhos, projetos, textos ou outras expressões artísticas que envolvessem bucetas. Às vezes compartilhavam suas próprias bucetas, uma com a outra.

Apesar de não ser muito frequente, as duas tinham um acordo de relação sexual casual que mantinham a anos. Teve início quando, depois de alguns meses de amizade, Camila sentiu uma tensão sexual muito grande entre elas e compartilhou com Cecí que correspondeu a sensação. Por vários motivos, decidiram não entrar num relacionamento monogâmico mas também acordaram em não ignorar essa atração sexual e em dar chances à isso.

A tensão sexual entre as duas se intensificava quando algumas coisas aconteciam em específico. Geralmente em períodos de mais criatividade artística – das duas partes – a atração sexual era praticamente inevitável. Sexo seria uma continuidade artística e uma forma de demonstrar carinho.

Dias depois de quando se encontraram para lerem os textos da universidade, Cecí ligou para Camila para contar sobre uma ideia de um projeto: “Vulgo Vulva”, que misturaria literatura com artes e feminismo. As duas animaram de entrar e produzir. Passaram mais de 1 hora combinando os detalhes por telefone, até que Cecí ia desligar e Camila interrompeu o tchau:

– Cecí, porque não vem aqui pra gente se pegar um pouquinho? Sabe como eu fico quando você me desperta pras artes. – disse Camila.

– Pensei o mesmo. Mas como tá aí na sua casa? Não tava recebendo umas amigas em casa? – disse Cecília.

– Estou, mas elas não ligam. Onde cabe uma buceta, cabem duas, três… – disse Camila.

Naquele mesmo dia, se encontraram. Cecí trouxe um buquê de flores. Camila estranhou e riram juntas. Decidiram cozinhar juntas pra lembrar os velhos tempos – ou os encontros anteriores. Nenhuma das duas cozinhava bem mas Camila fazia com que o ato de cozinhar parecesse mais bonito. Estavam ouvindo Luisa Maita e uma playlist gigantesca de cantoras que gostavam em comum. O dia foi entardecendo e luz do sol que estava forte, baixou um pouco.

– Gosto de quando a luz fica assim. – disse Camila.

– Gosto de você. – disse Cecí.

Camila se aproximou de Cecí, fez carinho em seu braço com a ponta dos dedos enquanto olhava para os seus seios. Cecí levantou seu rosto com os dedos e as duas se olharam e deram um sorriso frouxo. O rosto de Camila começou a esquentar quando Cecí chegou mais perto do seu corpo e entrou com os dedos em seu cabelo. Sua respiração ficou mais pontual. Respirava mais forte quando a boca de Cecília encostava em seu pescoço ou quando os dedos dela passavam em seus mamilos por cima da blusa. As duas tiraram as camisetas por conta do calor que elas mesmo provocaram. Com os mamilos ainda duros, Camila pediu um beijo e um abraço apertado. Assim o fizeram durante 5 ou 10 minutos.  Agora além dos rostos corados e os mamilos duros, as duas podiam sentir a lubrificação das suas vaginas e a tensão sexual aumentando.

Cecí colocou um dos dedos de Camila em sua boca. Depois dois… três. Ela sabia o quanto isso a deixava excitada e o quanto era prazeroso pra ela sentir a textura dos dedos que logo estariam dentro da sua vagina. Camila pegou os dedos molhados de saliva e massageou a parte de fora da vulva. Sentiu o clitóris inchado e as pernas começando a tremer. Esperou um pouco e enfiou dois dedos na vagina. O polegar permaneceu fora, massageando o clitóris em movimentos coordenados. Com a outra mão, sentia o seu rosto quente, seus lábios  e os seus seios. Mantendo todos esses movimentos até perceber um orgasmo. Cecí respirou fundo e depois da alma voltar para o corpo, disse:

– Dá pra gente fazer mais uma?

 

 


Brava – Conto Erótico

Posted: October 10th, 2020 | Author: | Filed under: himen elastika literatura erótica anti-pornográfica | Tags: , , , , | Comments Off on Brava – Conto Erótico

– Não gosto de transar com raiva.

Geralmente percebo um hype muito grande em cima da ideia de fazer sexo com as parceiras quando estamos nervosas com outras fitas ou mesmo iradas com nossas próprias parceiras sexuais. Como se, de certa forma, as relações fluíssem de um jeito muito mais prazeroso assim. Há controvérsias. Canso de dizer prazamiga o quanto discordo e, quase sempre, a gente concorda em discordar. Me preocupa a glamourização da ira e da violência adentrando nossas relações mais afetivas e carinhosas e as consequências disso. A comunidade lésbica jovem adotou esse rolê com uma intensidade profunda porque têm sido influenciada diretamente por lésbicas mais velhas, filmes, livros e a galera com sexualidade ativa que defende essa ideia.
Não vejo problema em transar com raiva às vezes por achar que os orgasmos e os beijos aliviam as sensações de tensão decorrentes da ira, ou ainda, por acreditar que a raiva melhore o desempenho sexual e afins. Mas, depender e defender a raiva como a maior emoção mobilizadora do tesão para todos os casos me preocupa. O motor das minhas relações sexuais com outras mulheres jamais poderia ser algo parecido.

– Bê?Bê? Tá aí? Cê viajou uns segundos. A gente tava rindo de você.

– Desculpa! Tava pensando sobre.

– Todo mundo também tava rs Enquanto cê tava no mundo da lua aí eu tava dizendo que gosto de fazer sexo quando estou brava com outras coisas da minha vida, não com a minha parceira porque aí é foda. (riram)

– Tipo brava com o patriarcado, bixxa? Mas e aí, cê consegue se concentrar sem ficar uma pilha de nervos?

– Claro que sim! Pra mim a raiva é o motor da ação, da criatividade e do poder, Bê! Audre Lorde já dizia.

– Haha, ah pois pra mim Audre quis dizer foi outra coisa, viu? Que a gente não deve negar ou ignorar a raiva e deve se apropriar dela para reagir à opressões e reivindicar coisas. Só que quando ela fala de sexualidade, erotismo na verdade, aí é outra fita. Não vejo a raiva sendo defendida alí. Nossos corpos não estão disputando por poder quando a gente transa ou pelo menos não deveriam. Por isso a raiva não me cabe alí, no momento com as companheiras. Deixo ela para quando a gente tiver que invadir uns espaços, construir novas políticas e etc.

– Ai Bê! Muito conservadora você. Relaxa rs

– É, deve ser…

Na real, pode ser mesmo. Com o boom de glamourização e de associação do sexo com a raiva a gente chega a se questionar se não estamos sendo exageradas. Mas, se eu puder escolher – e posso – prefiro transar quando tá tudo bem, de preferência à tardezinha, não à noite, e de luz bem acesa pra ver tudo. Mas isso daria outras discussões.
Depois de conversar com as meninas da bateria na praça, segui pra casa. De noite teria um date que achei que nunca ia rolar até que ela finalmente veio pra MG fazer um curso.

“Tô indo pra sua cidade semana que vem para um curso, pensei em te mandar mensagem para ver se você conhece um lugar barato pra dormir por aí- de preferência sua cama – por uns 3 só. Depois volto pra SP. Um beijo”. Essa foi a mensagem que recebi e que acelerou um pouco meus batimentos. Respondi “Vou te mandar um endereço de um lugar muito gostoso e arejado”, vulgo minha casa. Resolvi fazer uma janta boa para recebê-la.  Além disso precisaria deixar o lugar gostoso e arejado como prometi ou me defender dizendo que gostosa e arejada sou eu.

19:30hrs ouço umas palmas no portão. Não tinha terminado a janta, nem arrumado nada. Disse que ela havia estragado a surpresa e ela respondeu que gosta de ser a surpresa. Me deu um beijo lento e quente assim que chegou e senti arrepios. Pedi para que entrasse e ficasse à vontade. Enquanto isso fui para a cozinha jogar o molho no macarrão.

– Quer trocar a música? – eu disse.

– Não, xuxu. Adoro Luisa Maita. Me deixa leve, faz parecer que tô em casa.

– Que bom! – eu disse.

– Inclusive, já que pediu para que eu ficasse à vontade…

Tirou o vestido que vestia quando chegou. Jogou-o no sofá junto com sua mochila, suas coisas, sua calcinha e andou até mim com um rosto de suspense. Desliguei o fogo, fiquei quente. Ela mordiscou o meu pescoço e grudou seu corpo contra o meu. Nos beijamos durante uns 10 minutos na mesma posição até o momento em que tive a sensação de que teria um orgasmo visual com aquela cena.

– A gente pode ir para o sofá ou pra outro lugar que dê pra eu sentar em você? – ela disse.

Seguimos pra fora da cozinha mas, antes do sofá, encontramos o tapete do chão que pareceu mais perto e, já que não aguentamos esperar, caímos por alí. Ela tirou minhas roupas, os beijos demorados aceleraram e, quando as duas estavam extremamente excitadas, roçamos uma buceta na outra. Encaixamos depois de uns segundos e os meus olhos reviraram. Confesso que é difícil gozar nessa posição mas nada descreve a sensação de juntar uma buceta na outra e sentir – do jeito mais gostoso possível – a intensidade com que ambas estão excitadas. Ela teve um orgasmo. Eu gostei de ver e de sentir. Depois me masturbei enquanto ela olhava pra mim retomando a respiração e transamos durante umas horas.


Zine “Bula do Aborto Medicamentoso”

Posted: September 22nd, 2020 | Author: | Filed under: antropologia autonoma | Tags: , , , , , , | Comments Off on Zine “Bula do Aborto Medicamentoso”

zine bula do aborto medicamentoso      PDF

Zine lésbica e feminista sobre como funciona um aborto medicamentoso.

 

 


“Ovulendas” – Lendas da Ovulação

Posted: September 18th, 2020 | Author: | Filed under: himen elastika literatura erótica anti-pornográfica | Tags: , , , , , , , , | Comments Off on “Ovulendas” – Lendas da Ovulação

– Tô me sentindo  mais atraída por você hoje.

– Acho que é por causa das coisas que tão acontecendo aqui dentro.

– Onde?

– No útero.

E assim flertávamos falando sobre menstruação. Na primeira vez que nos vimos, a famosa conversa-sobre-signos não aconteceu porque gastamos todo o tempo daquela noite contando uma pra outra sobre nossas experiências menstruais. Só depois descobri que ela era libriana com ascendente em leão e as nossas vênus eram iguais: escorpião.

(…)

O nosso primeiro encontro foi numa loja de camisetas no centro. Eu estava lá porque uma camiseta roxa tinha me chamado a atenção e ela, porque morava por ali e tava dando uma volta. Esbarrei – literalmente – nela na sessão de regatinhas pretas e pedi desculpas envergonhada. Ela riu e disse:

– Desculpo se você me fizer um favor.

– O quê? – Perguntei fazendo uma cara estranha.

– Pega aquela regatinha ali no alto pra eu experimentar? Não alcanço ela rs

Fui pegar a bendita e vi que ali naquele cantinho tinham várias estampas incríveis de mulheres da área da música mas também dazartes, da filosofia, da política…

– Eles escondem as camisetas mais legais aqui? Toma a que você pediu. – disse.

– Basicamente isso. Essa loja é antiga e a uns anos atrás uma mulher administrava a maior parte das coisas. Ela que teve a ideia de começar a produzir camisetas com mais caras de mulheres e de outras áreas além da música.  O problema é que acabou não rolando, financeiramente, e os caras que cuidam daqui hoje deixam elas ali onde você encontrou.

– Puxa, mas essas são as melhores camisetas daqui. Até eu quero levar uma. Se você não tivesse me falado eu nunca ia saber… Obrigada.

– Se você não tivesse esbarrado em mim, talvez a gente nunca tivesse conversado. rs

Ficamos uns segundos em silêncio até que eu disse:

–    Sei que pode parecer estranho mas você quer tomar uma cerveja comigo? – fiquei vermelha de vergonha.

– Ah, eu quero. Mas me faz um favor antes?

Fiquei pensando no que podia ser, de novo.

– Você quer que eu pegue outra camiseta pra você?

– Não, haha. Você tem um absorvente pra me dar? Porque acho que desceu pra mim e eu tava despreparada então ia direto pra minha casa, que é aqui perto, mas se a gente for dar um rolê então preciso de um plano b.

– Ih, não tenho. Uso de pano e não tenho nada parecido aqui.

– Também uso mas, às vezes, a gente improvisa com outros, né?  A gente pode comprar no caminho pra algum lugar ou, de repente, podíamos comprar uma brejinhas no mercado e ficar lá em casa mesmo. Que cê acha?

– Topo!

Deu uns 15 minutos do mercado pra casa dela e senti um frio na barriga. No caminho descobrimos os nomes uma da outra, que éramos sapatonas e que no meu ciclo, eu estava ovulando e o dela estava só começando. Chegando em sua casa, ela me convidou pra tomarmos um banho juntas porque estava muito calor. A água gelada escorreu de um jeito muito gostoso em meu rosto. Fechei os olhos pra aproveitar o gosto da sensação e Marina aproveitou meus olhos fechados para me dar um beijo. Lembro da sensação de quase derreter, das pernas ficando bambas e do pescoço ficar quente. De todo modo, meu corpo parecia calmo e confortável com o beijo e com suas mãos que passaram a percorrer o meu corpo. A água não atrapalhou a lubrificação porque, à cada segundo, eu ficava mais molhada. O líquido que caía do chuveiro era liso e rápido, enquanto o que saía do meu corpo era grosso e mais gostoso de deslizar a mão. Do corpo dela saía um pouco de sangue. Marina me virou de costas pra ela, abriu minhas pernas e me abraçou. Tínhamos quase o mesmo tamanho. Ela beijou as minhas costas como se estivesse beijando a minha boca, usou a mão direita pra estimular o meu clitóris apertando como se fosse um botãozinho. Me apoiei na janela porque fiquei com as pernas tremendo e a água continuava escorrendo no rosto e no corpo. Meu clitóris inchou mais e seus dedos se mexeram mais rápido. Quando senti que ia ter um orgasmo, pedi pra tocar mais devagar pra prolongar a sensação. Sempre funciona. Depois do orgasmo, enfiei minha cara na água do chuveiro, ajoelhei e pedi pra chupá-la.

 


Socorristas (Conto)

Posted: September 3rd, 2020 | Author: | Filed under: himen elastika literatura erótica anti-pornográfica | Tags: , , , , , , | Comments Off on Socorristas (Conto)

Invadiram o palanque da Câmara dos Deputados na quinta-feira à noite após o expediente dos políticos nas reuniões de sempre que não decidem nada. Guardaram suas mochilas nas cadeiras, dormiram juntas enquanto outras viraram a madrugada repassando o plano de ação da manhã seguinte. Foi, com certeza, a primeira vez que tantas mulheres brasileiras estiveram no local. Claro que só aconteceu através de uma invasão. O efeito foi inquestionável. As câmeras de segurança foram hackeadas e segurança masculina foi fácil de enganar.

A primeira notícia jornalística que denunciou a ação só ocorreu após 16 horas de ocupação. Isso foi um recorde que demonstrou o potencial de organização das envolvidas. Até este momento, as paredes já estavam todas riscadas e pixadas com mensagens escritas ou coladas de protesto. A última proposta política que estaria rondando pela Câmara não poderia ser aceita.

– A minha vontade era a de invadir a casa de cada um deles e fazer o mesmo… o mesmo que fizemos aqui. – disse Sandra observando as paredes.

-Haja tinta! – Cintia deu um suspiro de sorriram.

– Sabe que eu senti falta dessa adrenalina percorrendo meu corpo? Já experimentei muitas sensações muitas sensações mas poucas como essa. – disse Sandra.

– Sim. Não tem paixão ou viagem para o interior que faça bater assim como essa experiência bateu pra mim. – disse Cintia.

Cintia e Sandra eram socorristas, ou seja, mulheres que acompanhavam ou facilitavam abortos clandestinos em contextos criminalizadores. Pensaram, diversas vezes, em fugir do Brasil pra outros lugares mas ir embora é difícil, principalmente , quando ir embora parece fugir ou desistir de casa. Então, nunca foram.

Pela manhã, as responsáveis pela ação organizaram um café e uma roda para compartilhar algumas impressões.

– Cansei de viver nesse contexto de guerra! – uma das mulheres da roda afirmou com o rosto preocupado.

– Foi uma delícia quebrar algumas cadeiras e fazer tudo. Tenho medo do que farão quando descobrirem mas mais medo ainda do que poderá ser feito, se pá por vingança, em nome da lei. – outra mulher da roda.

– Entendo que todas sintam medo, entendo o medo de vocês mais do que qualquer outra coisa. Só não entendo e não aceito o silêncio que estávamos vivendo lá fora antes que fizéssemos algo. Então, hoje eu prefiro viver o orgulho do que o medo. – Cintia falou enquanto saía da roda.

– Às vezes, esses espaços que criamos enchem a gente de medo, né? – Bárbara diz se aproximando.

– Muito. Queria que as mulheres pudessem sentir e perceber mais do que o medo. Sei lá, raiva, um pouco de orgulho ou sensação de satisfação seriam muito mais úteis. Mas entendo que não são emoções simples de serem sentidas pelas mulheres. A gente vive com a cara enfiada numa bacia de culpa e medo. – Cintia lamenta.

As relações construídas em ações políticas feministas são sempre muito complexas. Depois de superadas as barreiras da rivalidade feminina, a pedra no caminho  seguinte é dificuldade das mulheres feministas de se reconhecerem como agentes de ações certas, boas ou úteis.

Aquelas que não dormiram à noite , se prepararam para dormir pela manhã. Cintia, uma delas, arrumou um colchão e deitou a cabeça que precisava de uns minutos de calma. Lembrou de sua companheira que havia ficado em casa. Pensou no calor do seu corpo que seria ideal para que pudesse dormir mais tranquila. Pensou num abraço, em seus seios encontrando os seios dela, os braços enrolados nos cabelos curtos e depois em um beijo. Quase atingindo todos os 5 sentidos. Pensar assim trouxe um pouco de calma, apesar dos barulhos das discussões políticas ao fundo. Resolveu aproveitar a resposta do seu corpo à isso: a imaginação como instrumento anti-stressivo. Cintia imaginou que sua mão pudesse ajudar a tornar o exercício mais real. Caminhou os dedos pelo queixo, ainda com os olhos fechados, passou-os lentamente pelos lábios inferiores da boca, depois pelos lábios internos da vulva com a outra mão e abriu os olhos. Estava sozinha no espaço em que dormia. Ajeitou seu  lençol por causa do frio, esticou as pernas para poder contorcê-las durante o orgasmo e abaixou a calça até metade da perna. Pensou em Bela, sua companheira de novo, e imaginar seu rosto causou uns arrepios. Mordeu o dedo por um instante como fazia sempre que estava excitada. Sentir os pêlos crescidos da buceta com a mão inteira, depois com os dedos e, por fim, com o pulso. Gostava de como conseguia se masturbar girando o pulso no clitóris. Demorava um pouco mais do que quando fazia com os dedos mas Cintia curtia quando demorava. Bela, quando a chupava, dedicava uns dez minutos para cada pedaço, cada lábio, cada lado, cada ponto do território do corpo mas, se quisesse,  poderia provocar um orgasmo em 2 minutos. Às vezes, o corpo é simples. Foi assim que Cintia teve um ou dois orgasmos pensando em sexo oral. Respirou tranquila, lembrou que não poderia falar com Bela durante a ação e se levantou. Foi até onde Sandra dormia e perguntou:

– Posso botar meu colchão perto de você?

Sandra acenou dizendo que sim e dormiram. Minutos atrás, ela também teve um momento de masturbação reflexiva. A companhia de uma para outra fez com que dormissem.